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Prefeitura de Manaus cria emergência para contratar empresa para novo aterro

Entenda o que está por trás da falta dos estudos ambientais sobre o novo aterro no município.

Escrito por
Rhyvia Araujo
February 27, 2025
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Foto: A Critica / Internet

A Prefeitura de Manaus, através da Secretaria Municipal de Limpeza Pública (Semulsp) ao invés de cumprir os termos acordados com o Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM) e o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) para apresentar solução definitiva ao Lixão de Manaus, contratou de forma emergencial a empresa Fral Consultoria Ltda., pelo valor de R$ 2,98 milhões de reais. Com os despachos assinados no dia 9 de junho, a dispensa de licitação foi publicada no Diário Oficial do Município (DOM). 


A Prefeitura de Manaus ao utilizar o formato de contratação emergencial selecionou de forma direta a empresa contratada, sem levar em consideração critérios de uma concorrência para execução das obras.

De acordo com a Prefeitura, a FRAL deve realizar serviços como: 

  • selecionar áreas para o novo aterro sanitário de Manaus;
  • elaborar os estudos ambientais exigidos (EIA/RIMA);
  • organizar e conduzir as audiências e consultas públicas;
  • criar projetos executivos para a implantação do aterro e acompanhar as obras até a entrega ao operador — no caso o município.

A FRAL, cuja sede está localizada em Aldeia da Serra, Santana de Parnaíba (SP), já prestou serviços anteriormente para o executivo municipal.

Cenário crítico

Nos documentos ao qual o Diário da Capital teve acesso, não foram identificados documentos comprobatórios que justificassem que a empresa tenha expertise operacional ou qualificação técnica “excepcional” ou de “notório saber” para execução dos serviços aos quais foram contratados, tampouco os profissionais qualificados em seu quadro técnico para tal.

O Executivo está ciente do problema do aterro sanitário há anos — inclusive o tema esteve presente no plano de governo de David Almeida (Avante) em 2020, o que coloca em dúvida a emergência da contratação.


Sem o estudo do terreno, o cenário fica ainda mais crítico: agora o município acumula multas diárias, que já somam R$ 4,5 milhões, após descumprir com o TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado com o Ministério Público Estadual (MPE) em abril de 2024, conforme apurou com exclusividade o Diário da Capital.

“O município está intimado a cumprir a ‘obrigação de pagar’ o montante de multas diárias por descumprimento do TAC, totalizando R$ 4,5 milhões”, diz o MP em nota enviada à reportagem.

Entenda a trajetória da “emergência”

O acordo, conforme determinado pela Justiça, concedia à Prefeitura de Manaus um prazo de 140 dias para cumprir todas as exigências, com destaque para a apresentação do estudo ambiental do novo aterro. Entre as obrigações previstas, estavam a comprovação da solicitação ao Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), do termo de referência para a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (Rima) da área destinada ao aterro.

No entanto, o prazo esgotou em 26 de agosto de 2024 sem que as determinações fossem atendidas, deixando o município à mercê das sanções.

No mesmo período, a Prefeitura de Manaus, por meio da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (Semulsp), já iniciava as tratativas com a Fral Consultoria. Em 14 de maio, sem nenhum comunicado público, foi aberto o processo de contratação da empresa sob a justificativa de que a instalação de um novo aterro sanitário “deve ser executada por empresa especializada, em razão da complexidade técnica e ambiental que envolve o caso”, conforme consta trecho do documento.

A Semulsp também alegou ser “dispensável” a necessidade de um Estudo Técnico Preliminar (ETP) e da Análise de Riscos. Segundo a Secretaria Limpeza, as obrigações assumidas no TAC, já comprovariam a viabilidade da contratação, eliminando a necessidade de um estudo formal.


A gestão municipal cita ainda a Lei nº 14.133/2021, que regula licitações e contratos públicos, para embasar a dispensa dos estudos. A ‘flexibilidade da legislação’, segundo o documento, permite que a administração pública decida quando a elaboração dos documentos é necessária. 

“Pouco tempo”

A “falta de tempo” foi o principal fator que levou à contratação emergencial da Fral Consultoria, sem licitação, conforme consta no parecer da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (Semulsp), que cita que o prazo de quatro meses era “apertado”, além da ausência de equipe técnica capacitada como justificativas para a medida.


A Secretaria de Limpeza chega a apontar que o atual aterro, localizado no Km 19 da Rodovia AM-010, teve o tempo de vida útil estimado para encerrar em janeiro de 2024. Por outro lado, argumenta que a construção de um novo aterro e a desmobilização do atual envolvem diversas etapas burocráticas e operacionais, que demandariam mais tempo do que o disponível. 


A gestão municipal também alega que não teria equipe técnica suficiente para realizar as análises exigidas e, desta forma, teria optado por contratar uma consultoria especializada de forma emergencial.  

“Esta Secretaria possui limitado tempo para apresentação dos estudos necessários e honrar os compromissos assumidos pela gestão municipal [no TAC]”, afirmou a Semulsp.

Apesar da Justiça ter estendido o funcionamento do aterro sanitário de Manaus até abril de 2028, garantindo tempo hábil para a instalação e operacionalização de um novo local, o município justificou a contratação da Fral Consultoria como uma medida essencial para evitar o que classificou como um possível “caos na saúde e acúmulo de resíduos em todo o município”.

Mesmo devendo R$ 4,5 milhões por descumprir o TAC, o Executivo Municipal justifica, ainda, que a contratação da Fral Consultoria foi necessária para evitar penalidades com a Justiça.

Negócio fechado e as multas em andamento 

Apesar de fechar negócio com a Fral, o Ministério Público Estadual cobra agora o pagamento de R$ 4,5 milhões em multas diárias e a regularização das pendências ambientais e orçamentárias. Ao Diário da Capital, o MPAM diz que foi dado prazo de 30 dias à Prefeitura, a partir de 20 de janeiro de 2025, para contestar a ação.

Segundo o MP, além da falta de estudo, entre os compromissos descumpridos também há falta de medidas para incluir um programa orçamentário que contemple diretrizes, objetivos e metas para a construção do novo aterro no Plano Plurianual (PPA). O prazo de 120 dias venceu em 6 de agosto de 2024.

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