A menos de 72 horas para as eleições de 2024, a Polícia Federal (PF) articulou uma operação, nesta quinta-feira (3), para investigar possíveis membros da alta cúpula do Governo do Amazonas. A ação apura o uso de instituições da administração pública, como a Polícia Militar do Amazonas (PMAM), em uma suposta manipulação das eleições municipais de Parintins, no interior do estado.
A operação foi desencadeada após a divulgação de um vídeo que mostra uma reunião entre agentes públicos do estado, onde é apresentado um possível plano para intervir no resultado da eleição no município, no qual teria a participação de policiais militares e a instalação de grampos telefônicos.
A medida foi tomada em resposta a recomendações do Ministério Público do Estado (MPAM), que abriu um Inquérito Civil para investigar o caso. O inquérito apura ainda supostas ameaças de líderes comunitários ligados a uma facção de tráfico de drogas, proibindo o acesso de candidatos à prefeitura a certos bairros.
“As ações coordenadas do grupo criminoso teriam promovido a espionagem de pessoas ligadas a um grupo político do município e também monitorado o deslocamento de policiais federais com a finalidade de frustrar a atuação da Polícia Federal”, indicou a corporação.
Entre os alvos da ofensiva estão o ex-secretário da Cultura do Amazonas (SEC), Marcos Apolo Muniz, o ex-secretário de Administração, Fabrício Barbosa, o ex-presidente da Companhia de Saneamento do Amazonas (Cosama), Armando do Valle, o ex-chefe de Rondas Ostensivas (grupo de elite da PM), Jackson Ribeiro, e o ex-chefe do setor de inteligência da Rocam, Guilherme Navarro. A PF deve ouvir os investigados para esclarecer a relação do grupo com os fatos apurados nas investigações.
Na noite dessa quarta-feira, (2), o Governo do Amazonas informou, por meio de nota, o afastamento dos secretários que aparecem no vídeo, afirmando que, além de garantir a lisura das investigações, o ato tem como objetivo permitir que os citados se defendam de forma isonômica e justa. As exonerações, até o momento, não foram publicadas no Diário Oficial do Estado (DOE).
Apesar do secretário da Casa Civil, Flávio Antony, aparecer na gravação, ele é o único que não foi afastado do cargo. O Diário da Capital questionou o Governo do Estado sobre o motivo da permanência, mas até o momento não houve retorno.
CUMPRIMENTO DE MANDADOS
Os agentes iniciaram a operação às 6h desta quinta-feira (3). Segundo a PF, a operação mobilizou aproximadamente 50 policiais federais que cumpriram cinco mandados de busca e apreensão em locais identificados durante as investigações em Manaus. Não houve prisões.
A Justiça Eleitoral ainda proibiu os investigados de acessarem Parintins. O caso também levou inclusive ao aumento do efetivo da PF no município. O nome da operação faz referência aos apelidos dados à cidade de Parintins, “Ilha Tupinambarana, Ilha da magia”.
O caso foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República e ao procurador regional eleitoral, devido ao foro privilegiado dos secretários. Além disso, a portaria foi enviada a Wilson Lima para que tome conhecimento e adote as medidas necessárias. O Diário da Capital ainda aguarda posicionamento dos órgãos.
Gênesis da investigação
As investigações surgem a partir de um vídeo, gravado na casa de Adriane Cidade, prima e ex-assessora do deputado estadual licenciado Roberto Cidade (União Brasil), que é candidato a prefeito de Manaus com apoio do Governo do Amazonas. Ela também é investigada pela PF.
Em trecho do vídeo, o grupo alinha o deslocamento de policiais civis e militares a Parintins. A coligação do candidato a prefeito de Parintins, Mateus Assayag (PSD), foi quem divulgou trechos dos registros no último sábado (28). Segundo ele, a estrutura do Governo do Amazonas estava sendo usada para favorecer a campanha de Brena Dianná (União), candidata que recebe apoio do governador Wilson Lima (União).
“Lamento muito que tudo isso esteja acontecendo. Sem dúvida nenhuma, isso é um golpe gigantesco em todo o povo de Parintins. (…) Uma estruturação de uma verdadeira organização criminosa dentro do Governo do Estado, que arquiteta tudo isso que está acontecendo aqui, dia após dias. Tudo montado, planejado e arquitetado”, disse Assayag.
As gravações revelam que uma das ações planejadas pelo grupo envolve a mobilização de 28 homens da tropa de choque para realizar abordagens seletivas a apoiadores do candidato Mateus Assayag.
Em outra parte do vídeo, Armando do Vale justifica a estratégia ao afirmar: “Numa campanha, o que não vale é perder”, alertando os demais participantes sobre a importância de garantir o resultado.
O vídeo original possui cerca de 1h de duração, mas a imprensa só obteve acesso a 8 minutos do registro. O audiovisual foi entregue à Superintendência da Polícia Federal no Amazonas (PF-AM) para serem tomadas todas as medidas.