No período em que o golpe militar de 1964 completa 61 anos, o Ministério Público Federal (MPF) emitiu uma recomendação ao Município de Manaus, ao Estado do Amazonas e ao Comando Militar da Amazônia (CMA) para que seja alterado o nome de ruas, avenidas, rodovias e logradouros que homenageiam agentes do regime militar brasileiro, acusados de violações dos direitos humanos.
Segundo o MPF, figuras como Artur da Costa e Silva, Castelo Branco, Médici, Figueiredo e outros membros da ditadura devem ser reavaliados conforme as diretrizes estabelecidas pelo órgão.
Entre as ações recomendadas, destaca-se a solicitação para que o Município de Manaus, sob comando de David Almeida (Avante) e a Câmara Municipal, presidida pelo vereador David Reis (Avante) apresentem, no prazo de 90 dias, um estudo técnico em cooperação com outras autoridades municipais. O estudo deverá levantar todos os nomes de logradouros, prédios e vias públicas que mencionem ou prestem homenagens aos colaboradores da ditadura. A recomendação exige que, dentro de 120 dias, sejam realizadas as modificações necessárias nos nomes identificados, além de ser publicada uma justificativa para as mudanças, através de diversos canais, incluindo redes sociais e o Diário Oficial.
No caso do Estado do Amazonas, comandada por Wilson Lima (UB), a recomendação segue um caminho semelhante, com um prazo de 90 dias para a realização de um estudo técnico, e 120 dias para a modificação dos nomes dos logradouros públicos que estejam em desacordo com as recomendações de justiça de transição. Também será necessário publicar as razões dessas mudanças e criar relatórios sobre as vítimas de tortura, morte e desaparecimento durante o regime militar.
Já o Comando Militar da Amazônia, representado pelo General Ricardo Augusto Ferreira Costa Neves, foi orientado a se abster de fazer publicações oficiais que celebrem ou façam referência à ditadura civil-militar-empresarial no Brasil. O MPF também exige que o CMA apresente, dentro de 90 dias, um estudo sobre os logradouros sob sua jurisdição que possam conter referências a colaboradores da ditadura e que, se identificados, sejam renomeados conforme as diretrizes recomendadas.
Além disso, o CMA deverá disponibilizar ao Ministério Público Federal, dentro de 180 dias, todos os arquivos relacionados às vítimas da ditadura no Estado do Amazonas, com o intuito de colaborar na investigação e no reconhecimento das violências cometidas.
Recomendação
A recomendação foi assinada na última terça-feira (25) e considerou o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, criada para apurar graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. As manifestações acerca do acatamento da recomendação devem ser feitas no prazo de 20 dias e deve indicar as medidas que tenham sido ou que serão adotadas pelos destinatários.
Reflexo na CMM
Na Câmara Municipal de Manaus (CMM), o vereador Coronel Rosses (PL) disse ser contra as recomendações do Ministério Público Federal. O parlamentar considera a medida uma tentativa de deslegitimar a história e os feitos de figuras militares que, segundo ele, fizeram contribuições significativas ao país, ao estado e à cidade.
“Sou totalmente contra. A gente percebe alguns atos que realmente tem um viés de esquerda, para tirar de foco o nome de militares que fizeram por esse país, por esse estado, por essa cidade. E eu vou muito além, acredito que se a prefeitura tivesse um pouco mais, realmente, de reconhecimento pelos heróis do nosso estado, os nomes dos policiais militares, policiais civis, bombeiros que tombaram o campo de batalha defendendo a sociedade amazonense, deveriam também ter seu nome nos prédios públicos, ruas, logradouros, para que realmente pudesse haver algum tipo de reconhecimento”, disse Rosses.
Ele elencou a mudança de nomes como algo desnecessário e até prejudicial. “Vai ser um imbróglio muito grande para a população de Manaus. Isso aí para a população de Manaus são coisas totalmente sem valor, sem notoriedade, tão tentando fazer disso aí, um palanque, uma plataforma política, de algo que ao invés de ajudar vai atrapalhar. Qual mal está fazendo se a rua chama 1, 2, 3, 10, 100 e colocar um nome na rua que vai ficar muito mais difícil, até mesmo a geolocalização através dos aplicativos que todo mundo usa hoje”, finalizou.
Posicionamentos
O Diário da Capital solicitou respostas do Município de Manaus, do Estado do Amazonas e do Comando Militar da Amazônia para entender se a implementação das medidas será executada. No entanto, até o momento, não obteve retorno por parte das autoridades solicitadas.
61 anos do golpe militar
Há exatos 61 anos, entre os dias 31 de março e 1º de abril de 1964, o Brasil vivia o início da instauração da ditadura militar. O golpe de estado, que derrubou o governo do presidente João Goulart e instituiu um regime autoritário, perduraria por 21 anos e se caracterizaria pela repressão política, censura, tortura e assassinato de centenas de opositores.
Durante o período, qualquer forma de contestação ao governo era brutalmente silenciada. Líderes políticos, jornalistas, estudantes e militantes de esquerda foram alvo de prisões arbitrárias, torturas físicas e psicológicas, além de assassinatos e desaparecimentos forçados. A censura à imprensa, à cultura e à arte impôs uma limitação drástica à liberdade de expressão, e o país mergulhou em um clima de medo.
Apesar do fim da ditadura em 1985, o regime militar se destacou pela repressão violenta às manifestações populares. A intervenção nas eleições, o fechamento do Congresso Nacional e o controle da economia e das instituições foram algumas das características do período.