Segurança

Procedimento criminal apura estupros de mulher indígena durante custódia em unidade policial do AM

O MPAM informou que a medida foi necessária porque não houve investigação pela Polícia Civil, mesmo após a recomendação do órgão quando a vítima denunciou as agressões em Manaus.

Escrito por Redação
24 de julho de 2025
Foto: Divulgação/MPAM

Um procedimento investigatório criminal (PIC) foi instaurado pelo Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM) para investigar os abusos sexuais sofridos por uma mulher indígena da etnia Kokama, de 29 anos, identificada pelas iniciais L. S. F., em uma unidade policial de Santo Antônio do Içá, município no interior do Amazonas. O objetivo é identificar e responsabilizar criminalmente os suspeitos pelos crimes, que teriam ocorrido durante a custódia da vítima pelo Estado.

A mulher indígena foi mantida presa em cela masculina. — Foto: Divulgação

A instauração do PIC foi determinada pela procuradora-geral de Justiça (PGJ) Leda Mara Albuquerque e está sob a responsabilidade do Gabinete de Assuntos Jurídicos (GAJ) Criminal, coordenado pelo promotor de Justiça Reinaldo Alberto Nery de Lima. De acordo com o MPAM, o procedimento permite coletar provas, requisitar documentos e ouvir depoimentos para esclarecer a dinâmica dos fatos e apontar os autores dos crimes. 

O MPAM informou que a medida foi necessária porque não houve investigação pela Polícia Civil, mesmo após a recomendação do órgão quando a vítima denunciou as agressões em Manaus.

Em nota, a Polícia Civil do Amazonas (PC-AM) informou que a Delegacia Especializada em Crimes contra a Mulher (DECCM) instaurou inquérito policial para apurar as denúncias e que segue colhendo novos depoimentos para concluir o procedimento e encaminhá-lo à Justiça. Além disso, os agentes tiveram suas armas recolhidas. 

“Os policiais tiveram suas armas funcionais recolhidas e estão exercendo funções administrativas até o encerramento do procedimento administrativo disciplinar”, afirma o comunicado.  

A Corregedoria-Geral do sistema de Segurança Pública do Estado também instaurou procedimento próprio para apurar a conduta dos envolvidos, que pode resultar na expulsão dos mesmos dos quadros da instituição.

Gravidade do caso

Conforme o relato da vítima, os abusos ocorreram ao longo de nove meses dentro da unidade policial, cometidos por quatro policiais militares e um guarda municipal. Os crimes, descritos como estupros recorrentes e coletivos, teriam ocorrido na presença do filho recém-nascido da mulher, de apenas 20 dias. A vítima também foi mantida em cela masculina, sem atendimento médico ou psicológico após o parto.

A Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM) também atua no caso e recebeu a denúncia dos estupros em 28 de agosto de 2023, um dia após a transferência da vítima para o Centro de Detenção Feminino, em Manaus. Mas a mulher foi presa em 11 de novembro de 2022, por sentença condenatória a 16 anos e 7 meses de reclusão por crime hediondo, ao buscar a delegacia para fazer uma denúncia de violência doméstica. Na ocasião, não houve audiência de custódia, nem comunicação à Defensoria, em violação a garantias fundamentais. 

Foto: Fachada do CDF – Brayan Riker – DPE/AM

Mesmo sem ter sido formalmente intimada da prisão, o defensor público Murilo Breda, coordenador do Polo do Alto Solimões, que atende o município de Santo Antônio do Içá, reforça que a instituição agiu. “Assim que soubemos que havia uma mulher presa com um recém-nascido, protocolamos pedido de prisão domiciliar em dezembro de 2022 e reiteramos esse pedido várias vezes, sem resposta até hoje”.

A procuradora-geral Leda Mara Albuquerque destacou a gravidade do caso, ressaltando que os agressores são agentes públicos responsáveis pela proteção da população. Ela reforçou a necessidade de debater e reestruturar o sistema prisional nas comarcas do interior para garantir condições dignas aos custodiados.

 “Não podemos mais aceitar que mulheres sejam custodiadas em condições tão degradantes. A Lei de Execução Penal garante tratamento digno a todas as pessoas privadas de liberdade. O que essa mulher enfrentou é inaceitável — como promotora de Justiça, como mulher e como cidadã, não podemos silenciar”, afirmou a PGJ. 

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