A União e a Agência Brasileira de Apoio à Gestão do SUS (AGSUS) são alvos de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), que inclui pedido de liminar para garantir o fornecimento imediato de água potável às comunidades indígenas do Alto Rio Negro, no Amazonas.
Segundo o MPF, o governo federal não tem aplicado adequadamente os recursos destinados ao saneamento básico e apresenta falhas contínuas, desde 2020, no cumprimento de metas e cronogramas de abastecimento de água tratada em terras indígenas.
Na ação, o MPF solicita que a União e a AGSUS elaborem, em até 30 dias, um cronograma emergencial para implantar e reformar os sistemas de abastecimento de água previstos para 2024, ainda não concluídos. Também requer o cumprimento integral das metas estabelecidas para 2025, com a contratação definitiva de profissionais necessários, conforme o plano de trabalho do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) do Alto Rio Negro.
Metas e cenário atual
O Plano Distrital de Saúde Indígena (PDSI) 2024–2027 previa a implantação e reforma de sistemas de abastecimento em 25 aldeias da região entre 2024 e 2025. No entanto, segundo o MPF, o Dsei-ARN já vinha descumprindo suas metas desde 2020. Uma ampliação de 7% na cobertura de água potável, prevista para ser atingida até 2023, não foi alcançada.
Atualmente, apenas 3% das 742 aldeias do Alto Rio Negro têm acesso à água potável. O restante da população indígena vive em situação de vulnerabilidade hídrica, o que representa, de acordo com o MPF, uma grave violação dos direitos constitucionais à saúde, à vida e à dignidade humana. Mantido o ritmo atual, a universalização do acesso à água tratada no território pode levar cerca de 120 anos.
O MPF aponta ainda que a falta de água potável nas aldeias contribui para o aumento de doenças gastrointestinais, diarreias e enfermidades parasitárias, já registradas com incidência acima das médias estadual e nacional na região do Dsei-Alto Rio Negro.
Orçamento sem execução
Uma perícia econômica realizada pelo MPF revelou subutilização e cortes no orçamento federal voltado às políticas públicas de saneamento para povos indígenas. A verba inicialmente prevista para 2024 era de R$ 120,5 milhões, mas sofreu redução de quase 10%, chegando a R$ 108,9 milhões. Desse total, apenas 57,23% foram efetivamente executados. Já os R$ 13 milhões previstos por meio de medidas provisórias não foram utilizados.
Segundo o MPF, a baixa execução orçamentária, aliada ao atraso nas obras de abastecimento, demonstra a insuficiência da União em planejar e executar as políticas públicas voltadas à saúde indígena. Entre os fatores apontados para a ineficiência está a redução no número de profissionais do Serviço de Edificações e Saneamento Ambiental Indígena (Sesani/ARN), atribuída à falta de contratações por parte do governo federal.
“Se não há pessoal, orçamento, ou insumos suficientes para a execução dos serviços, tal fato não é justificativa para omissão na efetivação de direitos, mas prova de que a União não tem cumprido seu papel de planejar, gerir eficientemente e executar suas políticas”, afirma o MPF na ação.
O Ministério Público Federal também pede à Justiça a aplicação de multa diária em caso de descumprimento das determinações judiciais.