<p>A menos de quatro meses das eleições, o governo e o Congresso Nacional articulam a instituição de um estado de emergência para viabilizar o pagamento de um auxílio de até R$ 1.000 a caminhoneiros sem risco de infringir a lei eleitoral, segundo membros do governo ouvidos pela reportagem.</p>
<p>O estado de emergência seria regulamentado na própria PEC (proposta de emenda à Constituição) e afastaria todas as vedações ou restrições previstas em norma de qualquer natureza para a criação do benefício à categoria.</p>
<p>O objetivo é blindar o presidente Jair Bolsonaro (PL) contra travas fiscais e, principalmente, eleitorais.</p>
<p>A lei eleitoral proíbe a implementação de novos benefícios no ano de realização das eleições, justamente para evitar o uso da máquina pública em favor de um dos candidatos. As únicas exceções são programas já em execução ou quando há calamidade pública ou estado de emergência.</p>
<p>Por isso, segundo pessoas envolvidas nas discussões, a PEC conteria um artigo para reconhecer o estado de emergência em decorrência dos impactos do cenário internacional sobre os preços do petróleo, dos combustíveis e seus derivados.</p>
<p>O mesmo dispositivo instituiria o auxílio financeiro aos caminhoneiros autônomos em atividade no ano de 2022. As despesas para custear o benefício seriam feitas por meio de crédito extraordinário, fora do teto de gastos a regra que limita o avanço das despesas à inflação.</p>
<p>Há grande receio entre auxiliares do presidente de que a criação do benefício represente uma violação à lei eleitoral. Ainda que o benefício fosse previsto na PEC, uma parte dos técnicos teme questionamentos, uma vez que há vedação expressa à conduta.</p>
<p>A medida poderia ser usada para caracterizar abuso de poder econômico por parte da campanha do presidente, na avaliação de alguns técnicos. Nesse caso, Bolsonaro poderia ficar inelegível por oito anos.</p>
<p>Por isso, integrantes do governo e do Congresso buscavam uma saída para proteger o presidente perante a lei eleitoral. Na prática, o mecanismo do estado de emergência teria alcance fiscal, ao afastar regras previstas na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), e eleitoral, ao blindar a campanha de Bolsonaro.</p>
<p>Nos bastidores, a instituição do estado de emergência na PEC é comparada à criação do orçamento de guerra, mecanismo que abriu caminho aos gastos excepcionais de combate à pandemia de Covid-19. A diferença agora é que o texto deve estipular um valor máximo a ser gasto.</p>
<p>A alta nos preços dos combustíveis é considerada por membros da campanha do presidente como um dos principais obstáculos à sua reeleição. Bolsonaro está hoje em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).</p>
<p>Nesta quarta-feira (22), a prisão preventiva do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro contribuiu para reforçar o clima de apreensão na campanha. A avaliação de pessoas próximas ao presidente é de que o episódio abalou ainda mais um dos pilares de Bolsonaro, o discurso anticorrupção, usado para tentar se contrapor ao ex-presidente petista.</p>
<p>Em meio ao cenário desfavorável, o governo vai trabalhar para tentar aprovar a PEC dos combustíveis na próxima terça-feira (28) no Senado.</p>
<p>A expectativa é conseguir, com as reduções de tributos estaduais e federais, uma queda de R$ 1,62 no litro da gasolina e de R$ 0,70 no diesel, segundo cálculos apresentados pelo Ministério de Minas e Energia.</p>
<p>O texto atual da PEC autoriza um repasse de até R$ 29,6 bilhões aos estados em troca de eles zerarem tributos sobre diesel e gás até o fim do ano. Outros R$ 16,8 bilhões estão previstos em renúncias de tributos federais com a desoneração de PIS, Cofins e Cide sobre gasolina e etanol até o fim do ano.</p>
<p>Agora, a proposta deve incluir também as autorizações para implementar o auxílio a caminhoneiros e ampliar o Auxílio Gás, pago a famílias de baixa renda.</p>
<p>A intenção de pagar um benefício mensal de até R$ 1.000 aos caminhoneiros autônomos até o fim do ano busca amenizar a insatisfação desse público, que é um dos pilares da base de eleitores do presidente.</p>
<p>O novo valor do auxílio tem sido discutido entre integrantes do Palácio do Planalto, parlamentares e membros do Ministério da Economia.</p>
<p>Caso fique no teto de R$ 1.000, o repasse mensal aos caminhoneiros será mais que o dobro do piso de R$ 400 pago hoje às famílias do programa Auxílio Brasil, que contempla pessoas em situação de pobreza ou extrema pobreza. O benefício médio é de R$ 409,30, segundo dados de junho.</p>
<p>Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, havia em maio uma fila de espera de 764,5 mil famílias já habilitadas ao programa, mas que não recebem o benefício por falta de verbas dentro do teto de gastos regra que limita o avanço das despesas à variação da inflação.</p>
<p>O ministro Paulo Guedes estipulou um limite de R$ 5 bilhões para essas novas medidas, segundo fontes do governo relataram à reportagem.</p>
<p>Técnicos do governo ainda estão levantando o número de beneficiários potenciais do auxílio aos caminhoneiros autônomos, mas há a expectativa de que o público-alvo fique entre 650 mil e 900 mil beneficiários. A partir desse número e do limite, o valor do benefício poderá ser definido pelos próprios parlamentares, mas já há o diagnóstico que ele superará os R$ 400.</p>
<p>Apesar da disposição do governo em contemplar os caminhoneiros, a categoria critica a medida. "Caminhoneiro não precisa de esmola, mas de dignidade", disse o presidente da Abrava (Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores), Wallace Landim, conhecido como Chorão. Ele defende a mudança na política de preços da Petrobras.</p>
<p>No caso do Auxílio Gás, uma das possibilidades é reduzir o intervalo do pagamento do benefício, que passaria a ser mensal em vez de bimestral. Outra opção é dobrar o valor pago às famílias a cada dois meses.</p>
<p>O Auxílio Gás foi criado em novembro do ano passado e paga 50% do valor de um botijão de gás de 13 kg às famílias beneficiárias a cada dois meses. Em junho, o valor do benefício é de R$ 53, pago a 5,7 milhões de famílias.</p>
<p>A ampliação do Auxílio Gás deve dobrar o custo do programa, que hoje oscila entre R$ 275 milhões e R$ 300 milhões mensais.</p>
<p>No Ministério da Economia, a expectativa é que, mesmo com as medidas adicionais, o custo total do pacote contra a alta de combustíveis não ultrapasse os R$ 50 bilhões. Técnicos, porém, não descartam que o valor final fique maior.</p>
<p>Há ainda pressão por outras medidas adicionais, como a criação de um fundo de estabilização para subsidiar diretamente o preço do diesel, defendida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), mas que passou a ser rechaçada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).</p>
<p>Também há pedidos por um subsídio à gratuidade dos idosos nos transportes públicos municipais e uma linha de financiamento às Santas Casas, instituições médicas filantrópicas.</p>
<p>Em outra frente, a Câmara estuda incluir um imposto sobre a exportação de petróleo na MP (medida provisória) que fez ajustes para evitar que empresas obtivessem créditos por tributo não pago na desoneração sobre o diesel.</p>
<p>A ideia é que os recursos sejam usados para financiar as medidas para garantir a competitividade dos biocombustíveis em relação a diesel e gasolina, propostas em uma PEC que tramita em comissão especial na Casa e que pode ser votada em plenário antes do recesso parlamentar, que começa em 17 de julho. As receitas também poderiam ser destinadas à ajuda aos caminhoneiros.</p>
<p>A MP está sob relatoria do deputado Danilo Forte (União Brasil-CE). A ideia de taxar a exportação de petróleo tem apoio entre membros da base aliada e da oposição, mas enfrenta resistência da equipe econômica e do próprio setor de óleo e gás.</p>
<p>O relator da MP, no entanto, argumenta que a criação permitiria manter a competitividade dos biocombustíveis e outros efeitos benéficos à economia.</p>
<p>Apesar das críticas, deputados aliados de Lira afirmam que o imposto sobre exportações seria a medida mais imediata da lista de propostas em estudo.</p>
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<p>Fonte: <a href="https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/06/governo-e-congresso-articulam-estado-de-emergencia-para-criar-auxilio-a-caminhoneiros.shtml" target="_blank" rel="noreferrer noopener">Folha</a></p>