A Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas – Dra. Rosemary Costa Pinto (FVS-RCP) divulgou nesta segunda-feira (29/09) um novo boletim epidemiológico que acende um alerta sobre a escalada dos casos de suicídio e lesões autoprovocadas no estado. O documento traça um panorama preocupante, especialmente entre jovens e mulheres, e reforça a urgência de políticas públicas voltadas à saúde mental.
De acordo com o levantamento, em 2024 foram registrados 345 óbitos por suicídio, o que representa um aumento de 15,8% em relação a 2022, quando houve 298 mortes. Entre as tentativas, foram 1.073 notificações de lesões autoprovocadas neste ano. A maioria das vítimas são mulheres (62,2%), com faixa etária predominante entre 15 e 29 anos.
O boletim mostra ainda que os homens representam a maior proporção dos óbitos por suicídio (80,9%), sendo os adultos jovens, de 20 a 39 anos (35,9%), os mais afetados. Os principais meios utilizados nos suicídios foram enforcamento, enquanto as tentativas ocorreram majoritariamente por envenenamento ou intoxicação.
A diretora-presidente da FVS-RCP, Tatyana Amorim, afirmou que o monitoramento tem como objetivo embasar estratégias de prevenção.
“A violência autoprovocada e o suicídio são problemas de saúde pública que crescem, cada vez mais, e afetam a sociedade como um todo. É necessário promover ações intersetoriais e sensíveis às realidades locais”, ressaltou.
Interior concentra os índices mais altos
Cidades do interior do Amazonas aparecem entre os municípios com os maiores índices de violência autoprovocada e de mortalidade por suicídio. Entre as cidades que lideram o ranking de prevalência de tentativas estão:
- Envira (128,3);
- Carauari (123);
- Eirunepé (112,6)
Já entre as maiores taxas de mortalidade, os municípios que lideram o ranking são:
- Amaturá (43,8);
- Barreirinha (38,9);
- São Gabriel da Cachoeira (37,2).
Segundo o levantamento, 89% das tentativas ocorreram dentro de casa, e nos óbitos, esse número chegou a 68,7%. A coordenadora da Vigilância de Violências e Acidentes (Viva) da FVS-RCP, Cassandra Torres, destacou que os dados refletem vulnerabilidades sociais específicas. “Precisamos de estratégias específicas para cada território e grupo social, fortalecendo não apenas os serviços de saúde, mas também educação, assistência social e demais políticas públicas”, declarou.
Falar é uma forma de prevenção
Para a psicóloga Lídice da Matta, o silêncio em torno do tema ainda é um dos principais obstáculos para a prevenção.
“O silêncio gera tabu, preconceito e medo de buscar ajuda. Quando falamos abertamente, conseguimos quebrar estigmas, abrir espaço para que as pessoas compartilhem suas dores e saibam que não estão sozinhas. A conversa é uma forma de prevenção”, afirmou.
Ela explica que não existe um perfil único de pessoa vulnerável ao suicídio, embora alguns grupos estejam mais expostos, como quem tem histórico de transtornos mentais, uso abusivo de substâncias, perdas recentes ou experiências de violência. “O suicídio pode atingir qualquer pessoa, independentemente de idade, gênero ou condição social”, alerta a especialista.
Como identificar os sinais e agir
Segundo a psicóloga, os sinais de alerta podem variar entre diretos e sutis, como:
- Falar sobre morte ou querer desaparecer;
- Isolamento repentino;
- Mudanças bruscas de humor;
- Perda de interesse em atividades antes prazerosas;
- Descuido com a saúde e aparência;
- Frases de desesperança, como “não aguento mais” ou “minha vida não faz sentido”.
Para Lídice, é fundamental que familiares e amigos estejam atentos e saibam como agir diante de um possível caso. “O primeiro passo é ouvir sem julgamento. Demonstrar presença, acolhimento e interesse genuíno. Evitar frases como ‘isso é bobagem’. O ideal é encorajar a busca por ajuda profissional, acompanhar nas primeiras consultas, oferecer apoio no dia a dia e, em casos graves, acionar serviços de emergência”, orienta.
Ela reforça a importância de tratar o sofrimento psíquico com a mesma seriedade dada às doenças físicas. “Assim como cuidamos da saúde física com médicos, precisamos cuidar da saúde mental com profissionais capacitados. O acompanhamento psicológico e psiquiátrico reduz o risco, fortalece os vínculos da pessoa com a vida e oferece estratégias para lidar com a dor”, conclui.
Onde buscar ajuda
Em caso de necessidade, o Centro de Valorização da Vida (CVV) realiza apoio emocional gratuito, com atendimento 24 horas pelo número 188 ou pelo site oficial do CVV.
Além disso, a rede pública de saúde do Amazonas oferece atendimento psicológico e psiquiátrico em unidades básicas de saúde e CAPS (Centros de Atenção Psicossocial).