O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao comentar sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que descriminaliza o porte de maconha, pontuou que “é nobre” que haja diferenciação entre usuários e traficantes, mas afirmou que quem deveria ter a palavra final sobre a descriminalização do porte de maconha é a Ciência.
Segundo Lula, ter uma padronização com base em dados científicos evitaria o atual clima fervoroso entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Mas, ponderou que o STF “não precisa se meter em tudo”.
“Eu vou dar só palpite, não sou advogado e não sou deputado. Eu acho que é nobre que haja diferenciação entre consumidor, usuário e o traficante. É necessário que a gente tenha uma decisão sobre isso, não na Suprema Corte, pode ser no Congresso Nacional, para a gente poder regular. [O STF] Não pode pegar qualquer coisa e ficar discutindo, porque aí começa a criar uma rivalidade que não é boa para a democracia, nem para a Suprema Corte, nem para o Congresso. Eu acho que [a prerrogativa] deveria ser da ciência. Cadê a comunidade psiquiátrica desse país, que não se manifesta e não é ouvida?”, disse Lula em entrevista a Uol.
Ainda segundo Lula, a opinião de médicos e especialistas no assunto, devem ser levados adiante. “Não é uma coisa de código penal, é uma coisa de saúde pública. O mundo inteiro está utilizando o derivado da maconha para fazer remédio. Eu tenho uma neta que tem convulsão, ela toma. Se a ciência já está provando em vários lugares do mundo que é possível, por que fica essa discussão contra ou a favor? Por que não encontra uma coisa saudável, referendada pelos médicos que entendem disso, pela psiquiatria brasileira ou mundial, pela Organização Mundial da Saúde, alguma referência mais nova para dizer ‘é isso’ e a gente obedece?”, questionou o presidente.
O mandatário ainda lembrou que já existe uma lei de 2006 que impede a prisão de usuários. A Lei de Drogas, de 2006, entretanto, não estabelece critérios estabelecidos para diferenciar usuário e traficante.
“Se um dia um ministro da Suprema Corte pedisse um conselho para mim, eu falaria ‘recuse essas propostas’. A Suprema Corte não tem que se meter em tudo. Ela precisa pegar as coisas mais sérias sobre tudo aquilo que diz respeito à Constituição e ela virar Senhora da situação, mas não pode pegar qualquer coisa e ficar discutindo. Porque aí começa a criar uma rivalidade que não é boa, nem para democracia, nem para Suprema Corte, nem pro Congresso Nacional, a rivalidade entre quem é que manda, é o Congresso ou a Suprema Corte?”, afirmou Lula.
Nesta terça-feira (25), o STF decidiu descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal, em um julgamento concluído após nove anos de sucessivas suspensões. Com a decisão, o porte de maconha continua como comportamento ilícito, ou seja, permanece proibido fumar a droga em público, mas as punições definidas contra os usuários passam a ter natureza administrativa, e não criminal.
Hoje, a Corte ainda vai definir sobre a quantidade de maconha que deve caracterizar uso pessoal e diferenciar usuários e traficantes. Pelos votos já proferidos, a medida deve ficar entre 25 e 60 gramas ou seis plantas fêmeas de cannabis.
Após a decisão do STF, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, disse que a decisão invade a competência técnica da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a competência legislativa do Congresso Nacional sobre o tema, além de gerar uma lacuna jurídica no Brasil. O senador é o autor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2023 que torna crime a posse e o porte de qualquer quantidade de droga ilícita.
Também nesta terça-feira, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, determinou a criação de uma comissão especial para analisar a PEC 45/2023. Oriundo do Senado, o texto já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em 12 de junho. Se aprovada na comissão especial, a PEC segue para análise do plenário.
Sobre a PEC, Lula comentou: “Se tiver uma PEC no Congresso Nacional, a PEC tende a ser pior”, disse o presidente. “Era só a Suprema Corte dizer que já existe uma lei, não precisa discutir isso aqui”, opinou.