A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), principal entidade representativa dos povos indígenas, anunciou na quarta-feira (28) sua retirada da audiência de conciliação convocada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para discutir o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. A audiência, presidida pelo ministro Gilmar Mendes, buscava encontrar uma solução negociada entre as partes envolvidas, mas os representantes indígenas consideraram que seus direitos são inegociáveis e que o processo carece de paridade.
A tese do marco temporal, que está no centro do debate, estabelece que os povos indígenas só têm direito às terras que estavam sob sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em litígio na mesma época. A Apib, assim como outras entidades de defesa dos direitos indígenas, opõe-se firmemente a essa tese, argumentando que ela restringe indevidamente os direitos dos povos originários.
A decisão de sair da audiência foi comunicada logo no início da reunião desta quarta-feira, quando os representantes da Apib leram um manifesto e informaram ao juiz Diego Viegas, auxiliar do ministro Gilmar Mendes, sobre a retirada. Mesmo sem a presença da Apib, as audiências devem continuar, com a possibilidade de outras entidades serem convidadas para participar.
A insatisfação dos indígenas com a conciliação já havia sido expressa no início de setembro, durante a primeira audiência. Naquela ocasião, a Apib ameaçou deixar a mesa de negociação, alegando que seus direitos não podem ser objeto de negociação e que o debate estava desequilibrado.
CONTEXTO DAS AUDIÊNCIAS
As audiências de conciliação foram convocadas por Gilmar Mendes, que é o relator das ações protocoladas pelos partidos PL, PP e Republicanos, que defendem a manutenção do marco temporal. As ações também são contestadas por entidades representativas dos povos indígenas e por partidos alinhados ao governo, que questionam a constitucionalidade da tese.
Além de buscar uma conciliação, Mendes rejeitou um pedido de suspensão da deliberação do Congresso Nacional que validou o projeto de lei favorável ao marco temporal, decisão que causou descontentamento entre os indígenas. As reuniões estão programadas para ocorrer até 18 de dezembro deste ano.
Na prática, a realização dessas audiências evita uma nova decisão imediata do STF sobre o tema, dando tempo ao Congresso para aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que insira a tese do marco temporal na Constituição.
Em dezembro do ano passado, o Congresso Nacional derrubou o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei que validou o marco temporal. Anteriormente, em setembro, o STF havia decidido contra o marco temporal, decisão que foi utilizada pelo Palácio do Planalto para justificar o veto presidencial.