O resultado das eleições deste domingo (27) evidenciou fragilidades na extrema-direita aliada ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em todo o país. Embora tenha conseguido levar candidatos ao segundo turno, Bolsonaro enfrentou derrotas significativas nas principais cidades onde compareceu para realizar campanhas eleitorais. As principais apostas foram em Manaus (AM), Goiânia (GO), Fortaleza (CE), Belo Horizonte (MG), Belém (PA), João Pessoa (PB) e Niterói (RJ).
Ao contrário de 2018, quando o ex-mandatário obteve resultados expressivos e a onda bolsonarista dominou o Congresso Nacional, a imagem de Bolsonaro em 2024 não teve o mesmo impacto nas eleições municipais, indicando uma queda do movimento bolsonarista em todo o país.
Em Manaus, por exemplo, mesmo com dois candidatos à direita concorrendo às eleições, a preferência do eleitorado foi David Almeida (Avante), reeleito prefeito com 54,59% dos votos. Alberto Neto (PL), candidato apoiado por Bolsonaro, foi derrotado com 45,41% dos votos válidos.
Nas eleições de 2022, Almeida chegou a tecer apoio a Jair Bolsonaro, mas não surtiu efeito. Na segunda vinda do ex-presidente a Manaus, Bolsonaro fez questão de criticar David Almeida e fez menção às eleições de 2026. “Se [Manaus] escolher o capitão, vamos para a direita. Se escolher o ‘Pinóquio manauara’, vamos para o buraco (…) Se queremos que alguém conservador volte ao poder nas eleições de 2026, vamos investir agora nas eleições municipais”, discursou o ex-presidente no dia 15 de outubro.
Almeida, durante entrevista à CNN Brasil nesta segunda-feira (28), garante que a escolha de Bolsonaro em investir na campanha de Alberto Neto foi um erro. “A escolha do ex-presidente Jair Bolsonaro foi equivocada. (…) Aqui nós não vamos nos curvar diante da vontade de quem não mora em Manaus, que determine o futuro de quem mora aqui (…). Eu vou buscar apoio de quem estiver no poder, seja de esquerda ou direita”, disse David Almeida, que recebeu apoio dos senadores Eduardo Braga (MDB) e Omar Aziz (PSD), ambos da base do governo do presidente Lula (PT).
O analista político Helso Ribeiro, em entrevista ao Diário da Capital, observa que, embora o candidato de Jair Bolsonaro não tenha angariado o maior número de votos, a direita em Manaus não fica abalada. Ele acrescenta ainda que a derrota de Alberto Neto em Manaus pode ser atribuída a vários fatores.
“A gente vê que a direita não sai perdendo, não, pelo contrário (…) Não foi a falta de apoio do Bolsonaro que gerou a derrota, talvez até o apoio demais tenha afastado votos e é bom lembrar que Alberto Neto veio lá de baixo, talvez nem fosse candidato. Vejo múltiplos fatores para essa derrota e a gente não pode tirar o mérito de quem ganhou, que foi David Almeida, que soube conduzir. A princípio estava apertado, mas ganhou com quase 10% de diferença”, analisa Ribeiro.
O “apoio demais” de Jair Bolsonaro nas cidades brasileiras também não surtiu o efeito desejado. Segundo Ribeiro, o discurso ideológico à frente de propostas para as capitais pode ter implicado no resultado das eleições.
“Muitos deles bateram muito na tecla ‘direita raiz’ e esqueceram de focar em assuntos da sua cidade. O fato (do candidato) trazer um ex-presidente da república para fazer propaganda, onde a necessidade é tapar um buraco, fazer uma creche, gerar mobilidade urbana, isso vai influenciar muito pouco. É inócuo você pegar qualquer ex-presidente e querer que ele impulsione uma candidatura a prefeito. É claro que o êxito vai ser questionável”, pontua Ribeiro.
Por outro lado, Ribeiro também fez uma análise mais ampla sobre o Partido Liberal, destacando que, apesar das derrotas em capitais, o partido continua a crescer em outros cenários.
“Se você fizer uma análise do Brasil afora, o PL foi o partido que mais cresceu, mais teve votos – elegendo ou não – e foi o partido que mais elegeu vereadores. A gente não pode pegar essas capitais que foram para o segundo turno e querer que seja o norte da eleição brasileira. O Brasil vai muito além dessas cidades”, garante o cientista político.
Bolsonarismo enfraquecido
O apoio de Jair Bolsonaro não foi expressivo para eleger candidatos em 8 cidades, das 11 que receberam apoio direto do ex-presidente da República.
Além de Manaus, Bolsonaro tentou influenciar a votação ao acompanhar Fred Rodrigues (PL), em Goiânia, mas não conseguiu impedir a vitória do ex-deputado Sandro Mabel (União), apoiado pelo governador Ronaldo Caiado (UB). Mabel obteve 55,53% dos votos, contra 44,47% de Rodrigues.
Em Belo Horizonte, o prefeito Fuad Noman (PSD) foi reeleito com 53,73% e contou com apoio estratégico da esquerda, enquanto o candidato da extrema-direita, Bruno Engler (PL), foi derrotado com 46,27%.
Em Fortaleza, André Fernandes (PL) recorreu a táticas extremas, incluindo ameaças de morte, mas perdeu com 49,62% para o petista Evandro Leitão, que atingiu 50,38% dos votos, a única vitória do PT.
Cícero Lucena (PP) foi reeleito com expressivos 63,91% dos votos em João Pessoa, derrotando o ex-ministro da Saúde de Bolsonaro, Marcelo Queiroga (PL), que recebeu 36,09% dos votos.
Em Belém, o delegado Éder Mauro (PL) recebeu 43,64% e sofreu uma derrota expressiva para Igor Normando (MDB), da família Barbalho. Normando venceu com 56,36% dos votos válidos.
Em Palmas, o bolsonarismo também saiu em desvantagem, com Eduardo Siqueira vencendo com 53,03% dos votos válidos contra Janad Vaccari (PL) que recebeu 46,97%. Fora das capitais, Carlos Jordy, representante do bolsonarismo, recebeu 42,80% e foi amplamente derrotado em Niterói (RJ) pelo candidato do PDT, Rodrigo Neves, que venceu as eleições 57,20% dos votos válidos;
A principal vitória de Bolsonaro ocorreu em Cuiabá, onde o prefeito Abilio Brunini (PL) foi reeleito com 53,83%, derrotando Lúdio Cabral (PT), que obteve 46,2%. A direita também celebrou vitórias em Natal (Paulinho Freire), Aracaju (Emília Correa) e Campo Grande (Adriane Lopes), mas, em geral, o resultado das eleições foi desfavorável para o ex-presidente.
Apesar das derrotas enfrentadas pelos candidatos de Jair Bolsonaro, o cientista político Carlos Santiago vê um cenário promissor para o bolsonarismo e a direita em geral nas próximas eleições de 2026. Para ele, os resultados recentes não devem ser interpretados como um sinal de fraqueza, mas sim como uma reafirmação da força do ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Essas cidades só mostraram a força que tem o Bolsonaro. Fez ir ao segundo turno novas lideranças políticas, que saíram com uma votação expressiva, dando palco e palanque ao bolsonarismo. Em duas delas, Manaus e Curitiba, estavam disputando candidatos conservadores, de posições à direita. Então, não é o bolsonarismo que sai diminuído do processo eleitoral”, analisa Santiago em entrevista ao Diário.
Para Santiago, esse panorama indica que o bolsonarismo não só permanece relevante, mas que também está se fortalecendo para futuras disputas.
“A eleição majoritariamente foi vencida pela direita tradicional e a direita bolsonarista. A esquerda estagnou em 15% das prefeituras. Se antes o PL não tinha sido eleito em nenhuma capital, agora elegeu quatro delas. Com a maioria das prefeituras nas mãos da direita e da direita bolsonarista, a tendência é um congresso nacional em 2026 ainda mais conservador”, finaliza.